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- São Luís do Paraitinga – Em águas brancas
02 e 03 de outubro de 1999

Sábado, 02 de outubro de 1999
A noite tinha sido mal dormida, com medo de perder o horário de saída para São Paulo . Entre sonecas e vigílias, a manhã chegou e cinco e meia estava eu ligando o carro para ir até a sede da Pisa Trekking.
Uma hora e meia depois, cheguei. O Maurício com cara de sono e só a Paula lá. Cumprimentos e começamos a nos preparar para o divertido final de semana que viria.
Fomos os três tomar um cafezinho na padaria da esquina e enquanto isso chegavam mais alguns: o Fernando, a Cláudia e a motoqueira da Adriana. Aliás, a Adriana estava vindo de Pucón, no Chile e, com uma Harley, queria porque queria ir de moto para Paraitinga. Totalmente compreensível...
Nove horas da manhã e estavámos na estação Vergueiro "recolhendo" os demais malucos, para uma viagem de três horas até a cidadezinha. Estavam lá a Débora, a Cris, a outra Cláudia, a Ana, a Loo, a Marta... Acho que não esqueci ninguém!
Bom, nada de mais para contar sobre a viagem e por volta do meio dia chegávamos à cidadezinha de 14000 habitantes, localizada a meio caminho entre Taubaté e Ubatuba. Por cidadezinha entenda-se aquelas com praça central, com igreja e coreto, casas estilo colonial e um povo muito tranquilo. Legal.
Almoçamos e rumamos para o Parque Estadual da Serra do Mar, Núcleo de Santa Virgínia, onde estava o Paraibuna e algumas trilhas. Para o sábado, ficamos nas trilhas....
Com o Guto, um guia da Montana Rafting, brigando para que fôssemos rápido, porque parecia que a partir de determinado horário os guarda-parques não deixavam entrar na trilha, seguimos a trilha da Pirapitinga, um passeio de quase seis quilômetros no meio de uma mata atlântica razoavelmente fechada, com direito a alguns banhos de cachoeira e um conhecimento prévio do Paraibuna, onde o pau ia comer no dia seguinte.
A frente fria que veio da Argentina bateu pesado, e a garoa não parava de cair. Com frio, mas curtindo a mata e o rio, chegamos já de noite na sede do parque e voltamos à cidade.
À noite, depois do banho, jantamos e ficamos sentados um pouco na pracinha, vendo os locais fazer o "footing", ou algo do gênero. Decididamente, vida noturna não se encontra aqui.
Como entrou o horário de verão, e a gente ia acordar cedinho no outro dia, fomos dormir. Por hoje é só pessoal.
Domingo, 03 de outubro de 1999
Era prá acordar às sete, mas às seis os sinos da igreja central, obviamente próxima, perturbou o sono, anunciando seis da matina. Virei para o lado e tentei dormir, preocupado com um barulho no teto que eu não sabia se era rato ou pombo. Após alguns minutos, o rato bateu asas e eu vi que era um pombo. Sete horas, de pé prá tomar café.
Cafezinho gostoso e preparamos a mochila para carimbar o Paraibuna, o rafting mais legal de São Paulo.
Quem não animava muito era a chuvinha, uma garoa prá lá de molhada que esfriava até os ossos mas, já que chegamos aqui....
Foi o Régis que nos instruiu com os tipos de manobras que precisaríamos saber, as ordens de comando, etc. Aliás, o Régis era um dos guias nossos nesta aventura. Me parece que era campeão brasileiro de alguma modalidade... Frente forte, esquerda ré, direita ré, piso, peso à esquerda, parô, enfim, um monte de comando prá gente ir aprendendo e se preocupando em fazer certinho.
Com algumas desistências, entramos em cinco botes e começamos a curtir as seis horas de adrenalina. No meu estavam além de mim, o Régis, a Loo, o Lee e o casal Roberto e Marina. Enfim, éramos seis, e tudo gente fina...
No início, uma corredeirinha ali, outra aqui e muito remanso, lugar ótimo para praticar as manobras de rafting e preparar-se para as "pirambas".
Um pouquinho depois, a gente chega no Saltinho, que pelo nível de dificuldade e pelo nível da água, que estava baixo, não dava prá descer. Descemos foi dos botes e pegamos os mesmo no final da cachoeira. Não descemos, mas vimos que tinha muita água branca pela frente. E o coração já batia mais rápido...
Mais corredeiras e a primeira cachoeira: Salto Grande. Os guias prepararam a estrutura de segurança, eu dei minha câmera para alguém tirar foto lá de baixo e estávamos prontos! O Régis grita os comandos e entramos na violência das águas! São poucos segundos, mas começo a perceber que não tenho mais sangue nas veias. Só adrenalina! Na saída, remada forte prá trás prá não cair na nivel 6, à frente.
Mais uma portagem, que é carregar os botes e subir de novo mais abaixo. Isto porque ou o rio não permite a navegação por causa de pedras ou é muito furioso e a navegação ali é loucura. Era a hora do canyon do caixão.
Não sei porque deram este nome para aquele lugar, mas tenho sérias desconfianças. A cachoeira cai de lado num trilho de seus três metros e é neste triho que o barco dispara. Todos dentro e milhares de litros d'água na cabeça, numa pressão fenomenal. Algumas pessoas entrando em pânico (né Débora?) e outras meio alienadas da fria (literalmente) em que nos metemos.
Quando o barco finalmente desencalha, você fica com água, por cima, por baixo, por dentro e sabe-se lá por onde. O frio é totalmente esquecido e o barco desaba numa corrida maluca. Quando termina, fica a sensação de querer mais. E terá, pode contar com isso...
E manda ver nas corredeiras! Um prá lá, outra prá cá, uma que encalha o barco e outra que encalha de novo. O bote das portuguesas (pelo menos uma era legítima) foi apelidado por nós de o bote das encalhadas. Nome justo. Alias o nosso bote mudou de nome três ou quatro vezes. Por estarmos com muitos orientais, passou de Jiraya a Jaspion e de Jaspion a Fui!
Um pedaço de muito remanso e muita remada e chegamos à Ponte de Pedra, para mais uma portagem. Passamos por cima e já era quase que hora do almoço...
Mais corredeiras e desta vez os encalhados éramos nós. Por estarmos com seis no barco, enquanto os outros barcos tinham cinco, estávamos pelo menos cinquenta quilos mais pesados. O que nos valeu alguns apuros e mais estabilidade nos rápidos.
Quase chegando no ponto de almoço, encalhamos prá valer. O Régis desceu para soltar o barco e puxa de cá, empurra de lá o barco solta-se e empurra o cara prá cima de umas pedras. A Loo gritou "RÉGIS!!!" tão alto que meu ouvido ficou zunindo um bom tempo... Sem nenhuma conseqüência grave, chegamos a um remanso e almoçamos...
No almoço, frutas, bolachas, chocolate, tudo regado a uma garoa chata e insistente. Sofríamos com o frio e a cada lufada de vento, o corpo da gente dava um tremor involuntário.
Depois de cerca de uma hora comendo, voltamos à água. O melhor estava por vir.
Após um trecho de remanso, o Régis avisa que é a hora da Gamela de Pedra, e vendo sua felicidade porque o rio estava mais cheio, ficávamos a prever como seria a tal gamela...
"Vocês remam forte, mas forte mesmo, e quando eu gritar piso, vão prá posição e fiquem preparados para voltar a remar bem forte quando eu falar,ok?", dizia o Régis, antes da corredeira. A gente só conseguia escutar o grito da turma que estava descendo a dita cuja, sem ter a noção exata do bicho.
E lá vamos nós! Remada forte e ao grito "piso!" pulamos no fundo do bote, que pinoteava feito cavalo bravo. Ao grito de "Frente! Forte!", o Lee gritava feito um maluco: "Vai Edu! Rema!" e eu retrucava no mesmo tom enquanto a água deixava. Piso de novo, uma onda na cara e vencemos a Gamela! Um barataço!
Chama-se gamela porque tem um canto, depois da cachoeira, que a água roda num circulo de seus cinco metros, que parece uma panela, ou gamela, sendo mexida com uma colher.
Pausa breve para descanso e para o Régis tirar uma foto-surpresa de nós cinco e rumamos para mais diversão.
Algumas corredeiras abaixo, começamos a ver ao longe a Itapavão, uma queda nivel 6 e, portanto, sem chance de descer. Descemos do barco e fizemos uma trilha ao lado da queda, vendo os botes serem torcidos pela força da água na cachoeira. E que força! O bicho bufava, exalando uma nuvem de vapor, avisando os incautos que ali ninguém passa!
Voltamos aos botes e já era quase final de passeio. Faltava o tal do surf!
Chama-se surf ficar entre a cachoeira e o rebojo dela, onde as forças se equivalem e o bote fica por assim dizer estacionário. Estacionário é bem modo de dizer, ok? O bicho pula muito, entra muita água, mas é muito divertido!
Após algumas tentativas frustradas, o Guto entrou junto no barco para dar mais peso e o Roberto correu para a posição de carranca, esticando-se para fora do barco com a cabeça na cachoeira. Ao grito de "Frente! Muito forte!", a gente gritava feito malucos e remava feito pinel, isto é, eu e o Lee remávamos... O Régis e o Guto ficavam pulando no outro lado do bote para fazer contrapeso, a Marina e a Loo gritavam feito doidas e o Roberto firme na sua carranca. A cachoeira estava muito forte e era difícil ficar muito tempo ali, mas o pouco que ficamos foi muito legal. Batemos os remos acima, para comemorar e fomos embora.
O fim da brincadeira é no Sítio da Pedra Redonda, onde pusemos o barco no carro e tomamos chocolate quente com sanduíche natural. Chegamos a pensar que descobríramos o agente causador do mal de Parkinson, tamanha a tremedeira que todos estavam.
Um ônibus até a base de apoio, um banho bem quente, roupas secas, pose prá última foto e rumo prá casa.
Chegamos por volta das nove e meia da noite em Sampa e eu por volta das onze e meia em Sorô. Cansado, mas deliciado pela aventura.
Soube durante a viagem que há outros rios ótimos para o rafting, e pretendo fazê-los em outras oportunidades, mas por hora, sinto-me recompensado pela adrenalina em litro que o serviço de bordo do Paraibuna oferece.
Fica o comentário: Paraibuna. Recomendável para pessoas que gostem de viver!
















