Cananéia - Olha o Hugo !

22 a 24 de janeiro de 1999

Nos dias anteriores...

Fulano vai, fulano não vai, sicrano não pode ir, beltrano pergunta se tem um lugarzinho... A preparação para a viagem envolveu mudanças de plano de todo tipo, às vezes por causa do pessoal, às vezes por causa do hotel, às vezes por causa do barco.

Na mesma semana, o barqueiro (Abenel) que estava conseguindo um barco prá gente ligou duas vezes dizendo que o barco que tinha conseguido estava quebrado, uma vez o motor, outra vez o leme e conseguimos, a duras penas, um barco sem cobertura.

Esquecemos que o aniversário de São Paulo caía na segunda, dia 25 e o que para nós era um simples final de semana, para os paulistanos tornava-se prolongado, perfeito para aquela descidinha... Hotéis quase lotados, dificuldade para conseguir um mísero quarto, quanto mais para oito pessoas....

Sexta, dia 22

Enfim chegou o dia! Como disse Amyr Klink, em seu livro Paratii, acabávamos de escapar do "maior perigo de uma viagem , da forma mais terrível de naufrágio: não partir!". Pior que é verdade...

Era prá sair às seis, seis e meia, mas acabamos saindo às sete e meia, quase noite... Em dois carros, o meu Siena e o Corsa do Eliel, éramos em oito: Eu, meu pai Mário, o Evaldo e seu filho Eric, o Eliel (aniversariante do dia!), o Reinaldo, o Maurício, cunhado do Eliel e o Zé Luís. Preparados para o que der e vier, todas as situações previstas, rumamos para o litoral sul de São Paulo.

A estrada esburacada, a neblina, os caminhões na contramão, o tempo ameaçando virar de vez, nada nos demovia do firme intuito de sábado cedinho estarmos dentro de um barco!

Chegamos em Cananéia meia-noite e pouquinho e nos acomodamos no hotel Recanto do Sol, perto do pier onde pegaríamos o barco.

Apesar das tentativas desesperadas do Maurício de impedir o Zé Luís de dormir, logo, logo todos tínhamos embarcado, agora para a Terra dos Sonhos. Cada um sonhando com o peixe que iria pegar...

Sábado, dia 23

Cinco e quinze da manhã, o relógio tocou! Rapidinho pulamos da cama e começamos a preparar o material, comer alguma coisa (alguns comeram coisa demais, como verão em breve...), passar quinze litros de protetor solar fator 1000, pegar o caniço e o samburá e encontrarmos o nosso barqueiro.

Seis horas (ainda noite) todo mundo no pier. Menos o barqueiro. E o barco do barqueiro. Seis e meia ele chega e, todas as coisas no barco, rumamos para a Ilha do Bom Abrigo.

Bom... eu achei que estávamos rumando para a tal ilha, mas o barqueiro inventou de para um pouquinho ali, um pouquinho aqui e acabamos pescando durante meia hora no Mar Pequeno, um braço de mar que separa Cananéia da Ilha Comprida, e o Maurício logo pescou um bagrinho amarelo, chamado pelos caiçaras de conguinho. Gabou-se feito um doido que já não era sapateiro e nós tivemos de engolir esta provocação.

Sinceramente... eu não queria pescar ali, queria era ir para o Bom Abrigo, onde se não pegar nada, pelo menos a paisagem vale a pena... Um rápido lobby e lá vamos nós para o alto mar.

O mar estava calmo. Calmo, mas não espelho, diga-se de passagem. Quando chegamos à barra, onde as ondas crescem um pouquinho, o barco começou a balançar e preparar suas vítimas....

Mais de metade do caminho já tinha sido transposto e o barco pifa! A hélice deve ter batido em alguma coisa e a chaveta (acho que é este o nome) quebrou e tivemos que chegar de reboque na ilha...

Nesta, o Maurício já tinha ficado quieto. Quieto demais, pensava o Zé Luís... O Evaldo dormia no fundo do barco e o Eric o acompanhava. Tudo tranquilo, apesar da pescaria comprometida...

Fundeamos a cerca de cem metros da ilha e começamos a pescar. O dia estava agradável, depois da chuvinha da manhã e agora tudo estava tranquilo, com uma bela paisagem e a esperança de algo bater nas linhas. Logo fui fisgando o meu, que é prá não ser sapateiro. Um peixinho quase do tamanho do anzol de tão pequenino...

O Evaldo estava meio grogue e num lance, pediu licença e chamou o hugo. É, o hugo, aquele cara que vive embaixo do barco, algumas vezes dentro da privada, que chamamos quando a vontade de vomitar é grande. Boa ceva para o peixes, mas o Maurício, que começava a ficar filósofo, não deixou tirarmos foto do vexame do Evaldo. O porquê da proibição? Óbvio, ele foi o próximo e invocou o passado recente para que na hora de chamar o hugo ninguém tirar foto dele!

Nisto passou um barco e o Maurício, o Evaldo e o Eric foram para a ilha e ficaram na areia. Logo que eles saíram o Zé pegou o primeiro paru do dia. Numa varinha prá peixe pequeno, o peixe fez ele dar algumas voltas pelo barco antes de se entregar. Um pouco depois o Reinaldo perdeu um (estourou a linha porque o freio do molinete não estava ajustado!) o barqueiro (Seu Ciro) perdeu um e o Eliel pegou o dele, com um sorriso de "Eu acredito em Papai Noel", e foi só isso de peixe que pescou-se neste dia, além de um porquinho que meu pai pegou.

Meio dia e pouquinho, fomos até a praia, já que não tava pegando nada mesmo e comemos alguma coisa. O barqueiro negociava um jeito de levar-nos até Cananéia e eu resolvi, já que íamos ficar umas duas horas na ilha, tentar chegar no farol da ilha.

A ilha é feita de dois morros, sendo que o farol estava no topo do morro mais distante de nós. Bom... vamos lá... e uma subida no primeiro morro, uma pequena descida no intervalo entre corcovas, morrendo de medo das cobras e já estava quase lá.

O farol está meio abandonado e funciona automaticamente. Tem algumas células solares num canto dele e a vista lá de cima do farol é recompensadora. Vê-se todos os lados do Bom Abrigo, vê-se Cananéia, bem ao longe, a Ilha do Cardoso, a do Camboriú (não a de Santa Catarina, óbvio...), mas pela convecção, faz muito calor lá em cima, um calor úmido.

Tirei algumas fotos e voltei à praia. O barqueiro já tinha acertado com o filho dele de rebocar-nos e lá fomos nós de volta. No caminho, o Maurício armou uma vara com isca artificial de corrida e um peixe, sabe-se lá qual, atacou. Como a linho era muito fina e não tinha encastoamento, o peixe cortou a linha na boa e levou a isca artificial do Maurício. O pessoal revezava-se na proa para dormir, de tão cansados que estavam. O Evaldo, que tinha passado mal talvez por dormir na proa, aninhou-se na popa, perto do leme e parecia que o motor do barco estava ligado, tão alto seu ronco (brincadeirinha, né tio?).

Chegamos em Cananéia, tomamos um banho, vimos o São Paulo ganhar do Flamengo (uh! delícia!), eu e meu pai fomos visitar meu tio Rubens, que mora lá e ao voltarmos, fomos a um restaurante encher o bucho. Comida gostosa!

Voltamos e dormimos. Você quer o quê? Todo mundo moído.... Até amanhã.

Domingo, dia 24

Cinco horas e todos estávamos em pé. Café tranqüilo e fomos ao pier para saber se o barco tinha sido consertado. Tudo ok para o barco. Saímos mais tarde por causa da maré e deste modo resolvemos pescar no mar pequeno mesmo.

Só deu peixe porcaria: baiacu e conguinho. De vez em quando uma pescadinha, uma betara ou uma enchoveta. Quanto ao baiacu, vale um comentário: Êta peixinho desprezível este! Além de ser ladrão de isca, têm um dente muito forte, a ponto de quebrar o anzol, incha que parece uma bola e, para comê-lo, é preciso limpá-lo com muito cuidado para não derramar seu fel (na vesícula) em sua carne, porque ele se torna venenoso. É praga para pescador.

Meu pai divertia-se em trocar de vara com o Eric toda vez que fisgava um peixe. Cerca de seis ou sete peixes depois, o Eric percebeu e soltou um "Brigado, tio", reconhecendo a intenção do meu pai.

Pescaria tranquila, mais do que o desejado, o que permitiu a todos que quisessem pilotar o barco, tentar ligar o motor (ninguém conseguiu) e rir um bocado.

Lá pelas três horas, um temporal começou a se formar e decidimos voltar. Seguidos por uma parede branca de chuva e uma dezena de barcos, tentávamos chegar secos, mas não conseguimos! Tão logo chegamos no porto a chuva nos pegou e molhou tudo. Tudo bem, já que tudo é festa mesmo!

Aprontamos as coisas, botamos no carro e voltamos para Sorocaba, com muitas histórias e planos para ano que vêm voltarmos. Provavelmente dormiremos no barco ou em barracas na ilha. Mas isso é história ainda não contada... Até lá.